A Interseção entre Arquitetura e Clima nas Cidades Modernas.
O aumento das temperaturas globais está colocando à prova o conforto ambiental nas cidades. No Brasil, as previsões indicam que 2024 poderá ser o ano mais quente já registrado, fruto de uma combinação de fatores como El Niño, o aquecimento global, desmatamento e o adensamento urbano em crescimento acelerado. Para melhorar a eficiência do uso da infraestrutura e atender à demanda habitacional, muitas cidades adaptaram seus planos para permitir maior adensamento. Curitiba, por exemplo, pioneira no planejamento urbano brasileiro, adotou a construção de edifícios altos e densos ao longo dos corredores de transporte público, ocupando a totalidade dos lotes disponíveis. Esse modelo, replicado em grandes centros urbanos, tem resultado na criação das chamadas ilhas de calor, áreas urbanas com temperaturas até 4°C mais altas que as áreas periféricas. Esses fenômenos são intensificados pela ausência de vegetação e o uso excessivo de materiais que absorvem calor, como asfalto e concreto. O estudo conduzido pelo Climate Central, uma organização independente de pesquisa científica, mapeou o índice de ilha de calor urbana (UHI) em 65 cidades nos Estados Unidos, destacando os fatores que mais contribuem para o fenômeno. Entre eles estão as superfícies duras e escuras que absorvem luz solar e irradiam calor, a falta de espaços verdes que servem como agentes resfriadores naturais, e a alta densidade populacional, cujas atividades diárias, como o uso de transporte e a climatização de edifícios, agravam a sensação térmica nas áreas urbanas. O aumento da temperatura nas cidades resultou em uma explosão na demanda por sistemas de ar-condicionado. No Brasil, cerca de 40% das residências já possuem o equipamento, e as vendas só no primeiro semestre de 2024 ultrapassaram 2,7 milhões de unidades. A previsão de faturamento no setor é de R$ 41 bilhões até o fim do ano, representando um crescimento de 88% em relação ao ano anterior. Entretanto, a disseminação do uso de ar-condicionado, embora ofereça alívio imediato, tem o efeito colateral de aquecer ainda mais as cidades.
"Durante uma forte onda de calor, o uso massivo do ar condicionado pode adicionar até 20% mais calor no ambiente externo." Climate Central, 2024.
Nessa busca por conforto em nossas cidades, com climas cada vez mais extremos, acabamos contribuindo por torná-las mais insuportáveis. As tecnologias atuais de climatização, como o ar-condicionado, nos proporcionam bem estar dentro de nossas edificações, mas podem acarretar em efeitos colaterais negativos, como o aquecimento externo, sobrecarregamento da rede de energia elétrica e desumidificação do ar.
Fatores que nos levam a refletir: de que adianta estar em locais onde o metro quadrado é dos mais caros, se é inviável aproveitar seu valor, a paisagem e a cidade, a não ser de dentro de um aquário no centésimo andar com o ar-condicionado ligado? Como podemos melhorar nossas construções e cidades, otimizar as tecnologias para proporcionar maior conforto sem prejuízos e gerar benefícios mais acessíveis a toda a sociedade?
Achei necessário abrir esse diálogo nesse momento que estamos vivendo. Nos faz pensar que soluções imediatas muitas vezes a longo prazo não são benéficas. E mostra também que ou nos adaptamos e encontramos formas de habitar de formas responsáveis, ou vamos encontrar cada vez mais dificuldade em permanecer nas cidades. Adorei o diálogo!